terça-feira, 4 de maio de 2010

Algumas observações sobre o que se convencionou chamar de amor

1 – O amor tem um lado racional quase invisível, imperceptível aos olhos daqueles que apenas o consideram como um sentimento. Estar com alguém exige uma série de condições que derrubam qualquer disposição solitária do desejo. Atitudes, condições financeiras, modo de falar e pensar, estrutura corporal (cabelo, olhos, pés, mãos, rosto etc.), entre outros atributos, são elementos fundamentais para o manifestar desse sentimento-razão. A exigência da troca, ou seja, da ação de receber algo pela entrega (do corpo, do pensamento, dos sonhos) e pelo tempo implica um mecanismo perspicaz de planejamento, organização, direção e controle. A troca pressupõe uma utilização racional do sentimento; amar é também exercitar a razão, é guiar a disposição de estar com em uma direção que até mesmo o imprevisto se subordina. Quem casaria / namoraria um mendigo? Um tetraplégico? Uma pessoa deformada? Podem haver exceções, mas as exceções não movem a sociedade.

2 – O amor necessariamente exclui. Ninguém pode ficar com todo mundo. Amar duas, cinco ou dez pessoas? De qualquer forma, escolhas são realizadas, por mais amplas que sejam as disposições. Outras exclusões acontecem (umas em parte, algumas de maneira radical): colegas, amigos, parentes, trabalho, sonhos particulares etc.

3 – Amar é não ser. O amor exige sacrifício e prazer. Sem o essencial equilíbrio entre esses dois elementos, nenhuma união saudável e duradoura se sustém. Existe a concepção filosófica de que o amor, em perfeita sintonia, gera uma excelência do ser: aquele que ama pode tornar o outro melhor, pode fazê-lo crescer na vida. Tal fato pode realmente acontecer, no entanto a companhia (a intervenção, a colaboração, a entrega) da amada (o) cerceia possibilidades. Amar é não ser porque uma parte da vida é sacrificada por um projeto conjunto, objetivando o prazer-felicidade fruto da parceria. Com o outro, o caminho da renúncia se concretiza na ilusão necessária de uma completude pré-anunciada.

4 – O amor estabelece uma relação de poder. Alguém tem que ceder para o outro deliberar. Ceder não significa desistir do poder. Por vezes, trata-se de um mero adiamento para a posterior tomada de controle. E nesse jogo de resistência e retomada, a sensação de ser maior do que aqueles que estão afastados dessa trama...

5 – E daí que o amor seja algo racional? Ele exclui? Não possibilita ser? Enreda-nos em um jogo de poder? E daí?

6 - Que estranha mania do amor: ficamos juntos para aprendermos a ficar distantes...

Nenhum comentário:

Postar um comentário